COP30: Redes de sementes defendem estruturação e protagonismo na restauração ecológica
A manhã desta segunda-feira (17) foi dedicada a um bate-papo sobre o futuro da restauração ecológica no Brasil. A roda de conversa, que aconteceu na Casa Belterra, em Belém (PA), foi organizada pela Nativas Brasil e reuniu viveiristas, redes de coletores de sementes, auditores de projetos, representantes do mercado de carbono, investidores e organizações parceiras para discutir os principais desafios do setor. Participando do encontro, a Rede de Sementes do Cerrado (RSC) levou para o centro da discussão a experiência de quem sustenta, no território, a restauração de base comunitária.
Ao longo da roda de conversa, os encaminhamentos foram se desenhando em três frentes principais: disputar espaços de decisão para além do circuito ambiental, pressionar por contratos e editais que incluam recursos para estruturação das redes e avançar na construção coletiva de princípios, selos e mecanismos de certificação da restauração inclusiva.
Presidente da RSC, Anabele Gomes frisou que a ideia é que as redes de base comunitária se tornem protagonistas na restauração dos ecossistemas. “Quando falamos sobre restauração de base comunitária, temos que pensar em como estruturar isso. Se você diz que trabalha com base comunitária, tem que atender a determinados critérios”, defendeu.
A presidente lembrou que a RSC já discute a criação de um selo e de diretrizes específicas para orientar projetos e financiadores. “A gente vem pensando em ter um selo que garanta que aquela restauração é, de fato, de base comunitária. Fizemos uma reunião que vai ajudar a consolidar um guia da restauração, com princípios da restauração inclusiva. Nem todo mundo vai cumprir tudo, mas, se cumpre uma parte, já tem uma sinalização e, se cumpre tudo, terá o selo completo. A ideia é que essas referências sociais e educadoras venham da RSC”, explicou Anabele Gomes.

A RSC levou para o centro da discussão a experiência de quem sustenta, no território, a restauração de base comunitária
Desafios
Coletora Fabrícia Santarém, da Rede de Coletores Geraizeiros/COOCREARP, sintetizou o papel da restauração de base comunitária na reconstrução dos vínculos com o território, especialmente em regiões marcadas pela monocultura do eucalipto. “A gente acredita, e é prova disso, que quando a comunidade faz parte de todo o processo da restauração, a chance de sucesso é muito maior”, afirmou a coletora ao ressaltar a relação das comunidades com a conservação dos biomas. “As pessoas passam a olhar para aquela área com mais cuidado, com mais carinho, e isso traz de volta o sentimento de pertencimento. Eu venho de um lugar onde a monocultura avançou e muitas comunidades perderam seus territórios e áreas de uso tradicional. A restauração ajuda a reconstruir essa relação com a terra”, acrescentou.
Ao apresentar as dificuldades encontradas para transformar o discurso em contratos e projetos que cheguem na ponta, Fabrícia Santarém cobrou que os recursos cheguem, de fato, às comunidades que atuam na restauração. “Eu fico pensando como a gente pode se juntar para destravar isso. Acho que este é o momento ideal para unir forças. Não podemos passar mais cinco, dez anos na mesma história, porque quero ver as coisas acontecerem. Tudo anda, mas muito devagar. Precisamos sair da incerteza e ter segurança de que vamos conseguir escoar nosso produto, nossa restauração, que começa na semente”, completou.
Outro ponto mencionado durante o debate foi a capacidade das redes e grupos de coletores atenderem às demandas de mercado. Coordenadora do Núcleo de Restauração da RSC, Maria Eduarda Camargo chamou a atenção para a estruturação das redes. Segundo ela, muitas vezes o desafio não está apenas em ampliar a produção, mas em garantir a estruturação necessária. “Quando falamos de sementes comunitárias, não é só o preço de produção. É o custo de estruturar a organização, a estrutura física, financeira, a governança. São várias camadas que vão muito além do custo de produção em si, e isso precisa estar previsto nos projetos. Normalmente, não temos abertura para isso”, afirmou a coordenadora ao reforçar que as redes têm condições de atender à demanda o que falta é estruturá-las melhor.
Fotos: Iara Borges